domingo, 28 de dezembro de 2014

[Conferências] Qual a santidade para o nosso tempo?

Por Luciano Manicardi
19 de Outubro de 2012
Lisboa
A santidade não é uma questão moral. É a acção do Espírito Santo na história.

De acordo com Henri de Lubac, o Espírito é sempre imprevisível nas suas intervenções. O Santo que esperamos não será de acordo com as nossas concepções. (...) uma rígida ascese que o libertará de si mesmo.
No Evangelho
São mais de sessenta as vezes que a palavra 'santidade' aparece no plural. É um acontecimento pessoal mas também comunitário. A 'santidade comunitária' é procura essencial da Fé. O cristianismo deverá ser capaz de gerar um comunidade atenta a outro. Os critérios distintivos das comunidades cristãs, de acordo com os Actos dos Apóstolos, são: Eucaristia, oração, testemunho, acolhimento e o amor entre os irmãos (fraternidade).
O baptizado é já santo, terá de tornar-se aqui, no quotidiano, lugar teológico por excelência, o que já é.
A Santidade é relação viva com a pessoa viva de Jesus, que sustenta a santidade.
É também um acontecimento. Requer duas acções espirituais: a escuta (da Palavra) e o acolhimento (do Espírito, que acompanha sempre a Palavra de Deus). Estas duas acções conduzem à transformação da pessoa.
É, em definitivo, dom de Deus.
A Santidade ou implica a incarnação no quotidiano, ou não passa de uma ideia, de uma abstracção.
Interpela a nossa humanidade, sem deixar nada de fora.
O santo acredita mais na misericórdia que no pecado; está disposto a recomeçar sempre.
Jesus acredita na humanidade das pessoas que encontra. A santidade de Jesus faz surgir a Vida.
Hoje é preciso tornar homem em verdade, segundo Cristo. Humanizar o Homem.

[Recortes] A Corporalidade

Algumas notas depois de uma conferência em Braga sobre a teologia do Corpo, em Dezembro de 2011.
  • O Corpo é a minha existência (nome, biografia) no tempo e no lugar e é aí que se exprime.
  • O Corpo continua após a morte; termina a expressão corpórea daquilo que somos no tempo e no espaço.
  • O Corpo que é concretude relacional continua, vive, permanece.
  • A nossa existência traduz-se corporalmente.
  • A sabedoria resultada da vida da nossa experiência corporal.
  • O toque permite o toque na existência do outro; o poder de exprimir o bem e o mal.

«Os três reis do Oriente» Sophia Mello Breyner Andresen

GASPAR
... Chama à tua claridade a totalidade do meu ser para que o meu pensamento se torne transparente e possa escutar a palavra que desde sempre me dizes.

MELCHIOR
... E sobre o mundo do sono, sobre a sombra intrincada dos sonhos onde os homens se perdiam tacteando, como num labirinto espesso, húmido e movediço, a estrela acendia, jovem, trémula e deslumbrada, a sua alegria. 

BALTASAR
...
— Senhor, eu vi. Vi a carne do sofrimento, o rosto da humilhação, o olhar da paciência. E como pode aquele que viu estas coisas não te ver? E como poderei suportar o que vi se não te vir?

Conto completo: AQUI

sábado, 27 de dezembro de 2014

Para revisitarmos com frequência: «as 15 doenças da alma»

Nota introdutória: Para ter sempre, ao longo da leitura, como pano de fundo, as palavras do Apóstolo: Se um membro sofre, todos os membros padecem com ele; e se um membro é tratado com carinho, todos os outros se congratulam por ele. Ora, vós sois o corpo de Cristo e cada um, de sua parte, é um dos seus membros.  (1Cor 12, 26-27)

1- A doença do sentir-se imortal ou indispensável

«Uma Cúria que não faz autocrítica, que não se actualiza, que não procura melhorar, é um corpo doente». O papa recorda que uma visita aos cemitérios poderá ajudar a ver os nomes de muitas pessoas que «talvez pensassem que eram imortais, imunes e indispensáveis». É a doença daqueles que «se transformam em proprietários e se sentem superiores a todos, e não ao serviço de todos. Deriva muitas vezes da patologia do poder, do “complexo dos eleitos”, do narcisismo».

2- A doença da excessiva operosidade
Refere-se à que afecta quantos, como Marta na narrativa evangélica, «se imergem no trabalho, negligenciando “a melhor parte”: o sentar-se aos pés de Jesus». Francisco lembra que Jesus «chamou os seus discípulos para “repousarem um pouco”, por negligenciar o necessário repouso conduz ao stress e à agitação».

3- A doença da petrificação mental e espiritual

Atinge aqueles que «perdem a serenidade interior, a vivacidade e a audácia, e se escondem sob os papéis», deixando de ser «homens de Deus» e revelando-se incapazes de «chorar com aqueles que choram e alegrar-se com aqueles que se alegram».

4- A doença da excessiva planificação

Ocorre «quando o apóstolo planifica tudo minuciosamente» e acredita que assim fazendo «as coisas efectivamente progridem, tornando-se assim um contabilista ou um comerciante. Preparar bem as coisas é necessário, mas sem nunca cair na tentação de querer fechar e guiar a liberdade do Espírito Santo. É sempre mais fácil e cómodo repousar nas próprias posições estáticas e imutáveis».

5 - A doença da má coordenação
É contraída por aqueles que «perdem a comunhão entre eles e o corpo perde a sua harmoniosa funcionalidade», tornando-se «uma orquestra que produz barulheira porque os seus membros não colaboram e não vivem o espírito de comunhão e de equipa».

6 - A doença do Alzheimer espiritual

Traduz-se num «declínio progressivo das faculdades espirituais», causando «graves deficiências à pessoa». Constata-se em que «perdeu a memória» do seu encontro com Deus, em quem depende das próprias «paixões, caprichos e manias», em quem constrói «em torno a si muros e hábitos».

7 - A doença da rivalidade e da vanglória

«Quando a aparência, as cores das vestes e as insígnias honoríficas se tornam o objectivo primário da vida. É a doença que nos conduz a ser homens e mulheres falsos e a viver um falso “misticismo” e um falso “quietismo”.

8 - A doença da esquizofrenia existencial

É a de quem vive «uma vida dupla, fruto da hipocrisia típica do medíocre e do progressivo vazio espiritual que láureas ou títulos académicos não podem preencher». Atinge muitas vezes aqueles que, «abandonando o serviço pastoral, se limitam às tarefas burocráticas, perdendo assim o contacto com a realidade, com as pessoas concretas. Criam dessa forma um mundo paralelo, onde colocam de parte tudo o que ensinam severamente aos outros», tendo uma vida «escondida» e frequentemente «dissoluta».

9 - A doença dos boatos e dos mexericos

«Apodera-se da pessoa tornando-a “semeadora de cizânia” (como Satanás), e em muitos casos «homicida a sangue frio” da fama dos próprios colegas e confrades. É a doença das pessoas covardes que, não tendo a coragem de falar directamente, falam por trás das costas. Guardemo-nos do terrorismo dos boatos».

10 - A doença de divinizar os superiores
Infecta aqueles que «lisonjeiam os superiores», vítimas «do carreirismo e do oportunismo» e «vivem o serviço pensando unicamente no que devem obter, e não no que devem dar». São «pessoas mesquinhas», inspiradas exclusivamente «pelo próprio egoísmo fatal». Pode também atingir os superiores «quando lisonjeiam alguns dos seus colaboradores para deles obterem a sua submissão, lealdade e dependência psicológica, mas o resultado final é uma verdadeira cumplicidade».

11 - A doença da indiferença em relação aos outros

«Quando alguém pensa só em si mesmo e perde a sinceridade e o calor das relações humanas. Quando o mais especialista não coloca o seu conhecimento ao serviço dos colegas menos especialistas. Quando, por ciúme ou por astúcia se experimenta alegria ao ver o outro cair, em vez de o levantar e encorajar.»

12 - A doença da cara fúnebre

É contraída pelas pessoas «carrancudas e severas, para as quais ser sério implica pôr uma cara de melancolia, de severidade, e tratar os outros – sobretudo os considerados inferiores – com rigidez, dureza e arrogância». «A severidade teatral e o pessimismo estéril são muitas vezes sintomas de medo e de insegurança de si. O apóstolo deve esforçar-se por ser uma pessoa cortês, serena, entusiasta e alegre, que transmite alegria.» Francisco convida à boa disposição e à auto-ironia: «Quanto bem nos faz uma boa dose de bom humor saudável».

13 - A doença do acumular
«Quando o apóstolo procura preencher um vazio existencial no seu coração acumulando bens materiais, não por necessidade, mas apenas para se sentir seguro.»

14 - A doença dos círculos fechados

Quando a «pertença a um pequeno grupo se torna mais fácil do que a pertença ao Corpo, e, em algumas situações, ao próprio Cristo. Também esta doença parte sempre de boas intenções, mas como o passar do tempo escraviza os membros, tornando-se “um cancro”».


15 - A doença do lucro mundano, dos exibicionismos

«Quando o apóstolo transforma o seu serviço em poder, e o seu poder em mercadoria para obter lucros mundanos ou mais poderes. É a doença das pessoas que procuram insaciavelmente multiplicar poderes, e, para esse efeito, são capazes de caluniar, difamar e desacreditar os outros, até em jornais e revistas. Naturalmente para se exibirem e demonstrarem-se mais capazes do que os outros.» Uma doença que «faz muito mal ao corpo porque conduz as pessoas a justificar o uso de qualquer meio para alcançar tal objectivo, muitas vezes em nome da justiça e da transparência».

Papa Francisco, por ocasião da audiência da Cúria do Vaticano no tempo de Natal.
Andrea Tornielli
In "Vatican Insider"
Trad. / edição: Rui Jorge Martins

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

O Natal por Santo Agostinho (excertos)


«Hoje nasceu para nós o Salvador. Nasceu, portanto, para todo o mundo o verdadeiro sol. Deus Fez-se homem para que o homem se fizesse Deus. Para que o escravo se tornasse senhor, Deus assumiu a condição de servo. Habitou na terra o morador do céu para que o homem, habitante da terra, pudesse encontrar morada nos céus»

«... mesmo sem dizer nada, deu-nos uma lição, como se irrompesse num forte grito: que aprendamos a tornar-nos ricos nele que se fez pobre por nós; que busquemos nele a liberdade, tendo Ele mesmo assumido por nós a condição de servo; que entremos na posse do céu, tendo Ele por nós surgido da terra.»

«Chama-se dia do Natal do Senhor a data em que a Sabedoria de Deus se manifestou como criança e a Palavra de Deus, sem palavras, imitou a voz da carne. A divindade oculta foi anunciada aos pastores pela voz dos anjos e indicada aos magos pelo testemunho do firmamento. Com esta festividade anual celebramos, pois, o dia em que se realizou a profecia: A verdade brotou da terra e a justiça desceu do céu (Sl 84,12)».

«Neste dia, o Verbo de Deus revestiu-se de carne e nasceu de Maria virgem. Nasceu de modo admirável... Donde veio Maria? De Adão. Donde veio Adão? Da terra. Se Adão veio da terra e Maria de Adão, também Maria é terra. E se Maria é terra, entendemos quando cantamos: a verdade brotou da terra».

Et incarnatus est

Mozart: Missa em Dó menor - Et Incarnatus est (para ouvir)

Mater Christi

Das Irmãs de Belém / Enviada por um amigo a 25.12.2014.

Para ouvir: Vergine Madre 
(Dante, Canto XXXIII, Divina Comédia / Música Marco Frisina)  

Adoração dos Pastores

     El Greco / Prado.